Hoje é dia dos pais e eu, planta brotada, amanheci imersa em imagens, pensando e repensando o que sou...
Vi minha mãe,
no distante oitenta e dois...
era um março? abril? era julho?
no meio da sala da avó
chorava a ida do pai
tupi de quem herdei o orgulho
perdida raiz do que sou.
Depois,
há exatos vinte e dois anos atrás
num agosto
"mês de desgosto"
e "de cachorro louco"
não foi pouco o susto
quando o doutor me disse
que eram três bebês...
Ainda revi meu próprio pai,
naquele longínquo dia dos pais
brindando com vinho barato
à minha barriga e seu conteúdo abstrato
(não havia caras nem nomes
nem lindas bochechas de apertar).
Num dia em que tudo foi susto
e dúvida e sombra e espera no ar
meu pai comemorava seus frutos
e os novos braços de sua árvore a brotar.
Saio do mar da memória
cansada de nadar
vou mexer no jardim:
é domingo, o céu azul
flores novas, terra à vista
coisas que faço por mim.
A vida mais florida
rosas, gérberas, onze horas
e na manhã que parecia sem fim
ressoa a notícia: Geralda falecera.
Meu tempo pára.
Penso em minha mãe perdendo a mãe num dia dos pais,
penso na velha imersa em novos ais
penso na mais funda raiz que eu possuía
e que agora, quase sem função
nessa árvore cheia de galhos e frutos
larga-se da planta para integrar-se à terra.
Revolvo o coração
as mãos sujas de terra e de lágrimas
por ela, por minha mãe e por mim
por meu pai, pelo pai de minha mãe, pelo pai de minhas filhas
pela vida, que assim sentida
tem-me algum sentido
mesmo quando finda.
Ainda chorando abro um sorriso
lembrando do sobrenome que eu tanto desejei
e que Geralda, minha avó, leva consigo:
Gozzo.
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