Seis da manhã. O presente me alucina. Penso na menina e vejo o que virá: Nosso amor não é mais romance, para que a história avance é melhor me rebelar... Imerso nessa viagem, num instante me arrebato. Não pretendo permitir que ela me deixe! É por isso que me amarro entre os feixes de centenas de memórias. Assim, atado ao passado, viverá sempre ao meu lado, feito um relógio quebrado, a repetir mesma hora.
Ela sorriu. A boca larga e vermelha, rasgada na cara, escancarava uma alegria doentia da qual eu não mais fazia parte. Mirei-a desconcertado, como quem vê uma placa de PARE. Ignorava que morro, o meu pedido de socorro e meu medo sem igual. Disse que eu cheirava a álcool, desvencilhou-se de meus braços e saiu a duros passos. Ponto final.
Passam-se horas.
Olho-me no espelho e o que vejo? Olhos inchados de chorar, boca afogada nesse mar. Sob a luz baça que ingressa pela vidraça do banheiro, vejo incerta a causa dessa dor. Sinto-me preso a este amor que nada mais pretende dar. Feito suicida que se lança sob um trem sem esperança, ou inda mais, de uma ponte para o fim, imagino loucas cenas com a intenção apenas de que ela atente pra mim...
Cinco da tarde. A cabeça lateja. Estou prenhe de tristeza a rebuscar nas revistas algo pra matar o tempo. “Mato a louca, dou-lhe um beijo e então me mato”... A idéia me faz rir em desacato - não seria tão trágico, confesso. Nada de sangue, apenas vinho. No peito segue o burburinho, com o dia que se esvai. Se ela volta então eu peço: que retorne inteira e que não chame de asneira essa minha cena torta... ah, se ao menos ela tropeçasse na soleira da porta! Mas qual.
Anoitece e telefono. Ela ri quando eu uso a palavra abandono. Me engana e afoga em seu licor de mentiras doces. Sinto sono e adormeço. No coração opresso, a falta que ela me faz. Já espero que amanheça e eu desista dessa peça. Nem Romeu, nem nada mais.