"Uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana." (Huizinga, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 5ed. Saão Paulo: Perspectiva, 2007)
De todos os brinquedos que a vida me deu, o que mais me cativou foi o de jogar com as palavras. O jogo se faz completo quando escrevo e alguém replica, quando replico o que escrevem... É na intenção de reunir jogadores e assistência, que meu blog é feito.



sábado, 23 de março de 2019

Saudade, 1899, óleo sobre tela, 197 cm x 101 cm., Almeda Júnior.
Pinacoteca de São Paulo.
Lúcia, como eu queria te contar: Quando morri, já tinha me acostumado a pintar quadros de cabeça.
Na cabeça, Lúcia.
Abrindo a enorme galeria de telas não pintadas, tem a cena colorida e em alto contraste: você, pedra desbotada sob a sombra de uma árvore, me acolhe com ternura, caminhando sobre sua pele dura, eu, pequeno e indefeso inseto, inquieto e destacado.
Tem outra muito branca, em que estamos em franca queda, flocos de neve tão suaves, leves sobre o abismo que se estende em plongé, pelo ponto de fuga.
E também aquela, mais amarela, em que sou rio sozinho, cortando o deserto dos seus sentimentos...
Pra ter fim, meio e início, é isso, Lúcia.
Suspeito do que você diria, se os visse. Talvez os chamaria de naifs.
Talvez dissesse que eram insossos e ingênuos.
Você sempre foi a mais racional, a mais crítica e mais difícil, Lúcia.
E sim, se eu fosse menos passional talvez ainda estivesse aqui, suportando seus acertos. Você, a mais correta e ponderada de nós duas.
Às vezes me arrependo de não ter te ouvido, quando me pediu pra não sair correndo, durante aquela briga, pela rua.