"Uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana." (Huizinga, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 5ed. Saão Paulo: Perspectiva, 2007)
De todos os brinquedos que a vida me deu, o que mais me cativou foi o de jogar com as palavras. O jogo se faz completo quando escrevo e alguém replica, quando replico o que escrevem... É na intenção de reunir jogadores e assistência, que meu blog é feito.



terça-feira, 26 de abril de 2011

Bolero




Seis da manhã. O presente me alucina. Penso na menina e vejo o que virá: Nosso amor não é mais romance, para que a história avance é melhor me rebelar... Imerso nessa viagem, num instante me arrebato. Não pretendo permitir que ela me deixe! É por isso que me amarro entre os feixes de centenas de memórias. Assim, atado ao passado, viverá sempre ao meu lado, feito um relógio quebrado, a repetir mesma hora.
Ela sorriu. A boca larga e vermelha, rasgada na cara, escancarava uma alegria doentia da qual eu não mais fazia parte. Mirei-a desconcertado, como quem vê uma placa de PARE. Ignorava que morro, o meu pedido de socorro e meu medo sem igual. Disse que eu cheirava a álcool, desvencilhou-se de meus braços e saiu a duros passos. Ponto final. 
Passam-se horas.
Olho-me no espelho e o que vejo? Olhos inchados de chorar, boca afogada nesse mar. Sob a luz baça que ingressa pela vidraça do banheiro, vejo incerta a causa dessa dor. Sinto-me preso a este amor que nada mais pretende dar. Feito suicida que se lança sob um trem sem esperança, ou inda mais, de uma ponte para o fim, imagino loucas cenas com a intenção apenas de que ela atente pra mim...
Cinco da tarde. A cabeça lateja. Estou prenhe de tristeza a rebuscar nas revistas algo pra matar o tempo. “Mato a louca, dou-lhe um beijo e então me mato”... A idéia me faz rir em desacato - não seria tão trágico, confesso. Nada de sangue, apenas vinho. No peito segue o burburinho, com o dia que se esvai. Se ela volta então eu peço: que retorne inteira e que não chame de asneira essa minha cena torta... ah, se ao menos ela tropeçasse na soleira da porta! Mas qual.
Anoitece e telefono. Ela ri quando eu uso a palavra abandono. Me engana e afoga em seu licor de mentiras doces. Sinto sono e adormeço. No coração opresso, a falta que ela me faz. Já espero que amanheça e eu desista dessa peça. Nem Romeu, nem nada mais. 

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Ferviam medos,
favos e férias
quando ferviam filhos:
trilhos novos
para a estrada.

O tempo amorna as pimentas de outrora
os caminhos fugiram estreitos de chão
nem coelhos nem doces na primeira hora -
sem mentira sincera. Sem ilusão.

Há silêncio na casa, quase todos dormem

domingo de páscoa, domingo comum

observo os novos medos que me movem
eu estou em todos
e não sou nenhum.

terça-feira, 19 de abril de 2011

sexta-feira, 15 de abril de 2011

oigo lejanas
la respiración de una puta
la inspiración de un poeta
ollas rotas en la orilla del mar
miro lejana la luna llena
reina de todas las calles:
una puta silenciosa
un poeta loco en la plaza.


solo un baile
tu cuerpo involucrado en mis brazos
mis pisadas secas buscando a las tuyas
tu mirada ciega
y rota mi alma.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

era cara
a boca escancarada
ruindo as horas
numa risada infinda

era rara
a boca retorcida
em raiva
em dúvida com a vida


nestas horas de saudade
em que os detalhes viram centro
tua boca em movimento
é o recorte que me ampara:

bom ter tido tua boca
nesta vida louca e avara.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Brega para Cora Rufino

Um dia disse que me amava
e que sem mim já não vivia
um dia disse que queria
seguir comigo pela estrada
hoje está longe e descuidada
de todo amor que eu lhe dei
e eu sozinho aqui recordo
e de lágrimas transbordo
pela dama que eu amei

Essa ingrata tão distante
me enganou pela internet
disse que era militante
e que gostava da Ivete
quando a encontro na rede
ela ignora os meus sinais
eu lhe cutuco mas não cede
eu reclamo, mas no face
ela não responde mais...

Só pra me manter por perto
ela diz que me adora
finge que é piedosa
mas logo me joga fora
eu vou deletá-la logo
pois já não aguento mais
sempre on line e me ignora
e eu já sei que é mentirosa
mentirosa, essa Cora.

domingo, 3 de abril de 2011

variação sobre o mesmo tema:

se canto
é pra ter
o éter
abrir teu suéter
e deixar verter
teu ser tão mar
em meu ser tão.
amor antigo...
tudo a-mar: cerrado seco
além do fogo lambendo a palha
pouco se move
o infinito aqui,
ser tão e céu.
amor antigo...
tudo mar: espelho velho
olhos sol queimando a pele
sal dos gestos
e gargalhadas
ondas agitadas no abismo
engaste rústico, emoção e pedra

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Um olho mira, aponta, e erra em cheio o coração disparado.
Fora, cursor exigindo palavra, dentro, frases desconexas vertendo,
artérias estouradas.
Amanhece.

Susto e sono.
Silêncio,
só.

Pediria ao pai -  acaso pai houvesse -
a profissão de professar impurezas próprias...
Estabelece-se firme o caos da norma.
Amontoa títulos
ignora que, títere, a língua se desfaz, ilógica,
parada porque de céu desprovida,
pária, perdida.

Pobre boneco, esse contorcido.
Especula a tela, naufraga em mortos tecidos.
Inteiro entre feridos
alimenta-se, antimatéria,
apodrecido, solitário e deus:
Um poeta, para os seus.