Quando a noite se agiganta e nina o mundo
Com silêncio escuro espesso e calma e paz
Eis que o monstro manifesta seu profundo
Interesse em consumir tudo e o que mais:
Se faz lava e lava o rosto e o travesseiro
Se faz neve e cobre tudo ao meu redor
Cala o sono, a cor, o verbo, o amor inteiro
Me sufoca, estripa e grita, vencedor.
Todo dia o sol vem ver se teve termo
Essa luta cansativa e renovada
Ilumina cada canto desse ermo
Me revela a carne viva e destroçada.
O relógio se atrasou à minha espera
Fico vendo seu bater descompassado
Ele assiste e eu alimento a besta fera
Que inerme e monstruosa vive ao lado...
A enveneno pra recuperar a fome
E com ela, nos abismos me atiro
Ela ataca tudo aquilo que tem nome
E é por isso que a combato, ataco, firo.
Eu não sei o que será, se haverá trégua
Nessa luta estendida noite e dia
Meu descanso é transformar-me em rara égua
E, com asas, trotar sobre a poesia.