terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Impotência


       "12 years a Slave", dirigido por Steve McQueen

quando o chicote
lambeu a pele da negra
e trovejou grito
choveu sangue
e lágrima

eu
em torpor infinito
só pude sentir vergonha
de ter nascido.


domingo, 23 de fevereiro de 2014

Seca

rápido, mas sem pressa
desliza feito rio
sua mão sobre o vazio

esgota os lamentos 
carrega as sombras do fracasso
e as toras de mal querer

inunda

agradecida
fendida e seca
a pele terra
vai te sorver

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Continho besta e sem razão

Depois de um trago pra Jah
Esperança não criou asas,
desesperou,
desceu correndo as escadas
tropeçando nas palavras
gritadas
amarrotadas 
por tanto, tanto tempo guardadas.

Cuidadosa e calmamente
já tinha guardado em si
trinta e dois Norpramin, 
vinte e três Cipramil 
mais um copo de açaí.

Me lembro bem de Esperança
porque ela foi a primeira
que vi morrer, em criança, 
no antigo Jardim Palmeira.  

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Banco de reserva

Quisera eu compor um poema
que falasse da minha incompreensão
diante do baile das luzes
que vêm e vão.

Quisera mostrar-me estupefata
diante do sol que me abandona
e da noite que me cobre exata.

Quisera eu escrever um poema
para exprimir esse luar
casado com tamanha solidão
mas a carne maturada me diz não!

E por baixo do sal
um velho peregrino
vem cantando um hino
que louva, disperso,
no amontoado do verso,
o Foda-se Futebol Club.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Coração verde

o sol veio de mansinho
sem violências nem raivas
e eu fui cursando o trilho
de um dia sem palavras
tudo tão distante e frio
tudo freio
e a vida à milhas

hoje eu passei o dia
regando a face com sal
olhando pros passarinhos
e achando tudo banal

eu sei que haverá um dia
que será só para isso,
pra de tudo se esquecer...
mas quando o sol já se ia
pro outro lado do mundo
hoje eu desejei profundo
esse dia de não ser!

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O diabo do meu pai

O diabo do meu pai aparecia num redemoinho.
O diabo do meu pai adorava confusão: 
gostava de se meter entre irmãos que brigam, 
amigos que brigam, casais que brigam.
O diabo do meu pai era corajoso demais
e seus seguidores eram heróis.
O diabo do meu pai adorava beber,
fosse sangue, 
fosse álcool,
ou os dois.
O diabo do meu pai era ladrão.
O diabo do meu pai roubava na escola.
O diabo do meu pai às vezes se fazia de bom, 
ia orgulhoso à Igreja:
o diabo do meu pai era soberbo.
O diabo do meu pai era preguiçoso.
O diabo do meu pai não tinha data.


Foi num fevereiro que ele morreu... 
E eu sinto uma saudade do diabo 
ao lembrar das histórias de diabo
do meu pai.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Adubando a vida

Louca
faz um escarcéu
me julga e me joga
na vala comum das ações
dos chegados seus.

Sem motivos me condena
na ignorância incontida...
enquanto observo, serena,
a ironia dessa vida:

o céu, que carrega no nome,
não disfarça seu rastro de estrume.